sábado, setembro 26, 2009

Opinião - O crescimento dos blogs evangélicos

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João Cruzué

Existem duas
correntes de pensamento diferentes entre os blogueiros evangélicos sobre o uso de políticas mais agressivas de popularização do uso de weblogs entre as lideranças evangélicas. Como participante ativo da blogosfera desde 2004, não posso deixar de registrar o aparecimento de um fenômeno recente, isto é, a multiplicação de blogs evangélicos na Internet. Blogueiros mais antigos (e experientes) são ou estão cépticos, pessimistas, quanto ao futuro disso. Todavia, nadando contra a corrente, venho defendendo uma visão diferente ao longo de minhas publicações na UBE - União de Blogueiros Evangélicos.

Segundo os mais antigos, a safra de novos blogs vem acrescentando muito pouco à WEB. Como são bem exigentes, eles se aborrecem com a pobreza de conteúdo e o excesso de cópias de trabalhos alheios. Nisto em concordo com eles - em parte. Sim, pois, a experiência só vem com algum tempo. Como blogar é um neologismo, a banda larga ainda é muito restrita e as plataformas gratuitas ainda não foram bem divulgadas, temos mesmo algo novo e certa confusão, que os mais pessimistas rotulariam de caos.

Não é nenhuma novidade, entretanto, que a forma de pensamento ocidental recente tem um viés descendente ao individualismo. Muita comunicação (virtual) e pouco contato no mundo real. Um comportamento que evidentemente destoa do pensamento cristão original. Cristãos individualistas é um contra-senso na teoria, que infelizmente vem mudando por razões várias cujo propósito não vai ser discutido aqui. Apenas deixo registrado que sito é uma anomalia.

Com o advento de uma tecnologia digital nunca antes compartilhada, com plataformas e hospedagem gratuitas, estamos diante de um momento único. Uma época onde é possível levar a palavra de Deus na forma escrita para todos os cantos da terra. Acostumados a isso nos últimos cinco seis anos a maioria dos blogueiros evangélicos antigos ACHA que isso é algo comum. Que uma comunicação global sem censuras é algo que sempre houve.

Puro narcisismo. É isso que penso. Um cristão quando esconde para si o que poderia compartilhar com outros entra pelo caminho do egoísmo, e com isso perde a visão. Blogs cristãos para mim são um meio - e não um fim. Embora isso seja mesmo tentador (e frequente) blogar pelo simples prazer de ficar admirando a própria "criatura", o que acho ser um desvio da conduta cristã.

Nem todos serão grandes blogueiros. Nem todos escreverão com graça. Nem todos terão paciência para escavar e adubar seus blogs até que frutifiquem. Isto é natural e até esperado. Como também é verdadeiro afirmar que os que investirem na oração e na redação irão além do que seja esperado.

Minha visão é esta: Que todo líder evangélico tenha consciência de que deve publicar um blog. Para isso tenho investido em um serviço de suporte www.comoblogar.blogspot.com há mais de dois anos. E mais: feito divulgações das vantagens de um Blog em mais de 800 comunidade de Orkut nos últimos quatro anos. Acredito que a sabedoria para usar um blog vem com o tempo de prática, teimosia e observação de como outros cristãos blogam.

Ajudo na administração da UBE desde setembro/09. Ela é ma comunidade social agregadora de blogs a partir de uma plataforma NING. Em dezembro/2008 a UBE possuia cerca de 1.400 blogs. Nos nove meses seguintes foram agregados mais de 3.600 blogs chegando ao final de agosto à marca histórica 5.000 blogs afiliados. São assembleianos, batistas, presbiterianos, metodistas. Irmãos blogueiros das Igrejas: Universal, Mundial, Graça Internacional, Deus é Amor, Brasil para Cristo e dezenas de outras importantes denominações.

Nossa visão já é uma realidade. É evidente a existência de um movimento genuinamente evangélico de criação de blogs para publicar textos cristãos. Levar qualidade para ao trabalho destes blogueiros é nosso maior desafio. Isso vai ser possível?

No meio cristão as impossíbilidades não costumam ficar de pé por muito tempo. Basta duas pequenas coisas ao nosso ver. Investir no próprio talento, a começar pela produção de textos de própria lavra contando o que Jesus tem feito na vida de cada um. Eu comecei publicando testemunhos em 2003/2004 no site do Pastor Silas Malafaia. Depois dei sequência escrevendo mensagens do amor de Deus. Pode não parecer importante, mas eu gosto muito de ler textos que expressam os sentimentos, a maneira de pensar de um blogueiro, não importando tanto para mim a questão ortográfica. Se cada blogueiro aprendesse a colocar em textos suas idéias, com o passar do tempo, e sob a ação das critícas, seu pensamento poderia evoluir.

Escrever o que se pensa e testemunhar em textos das experiências pessoaiscom Deus. Por mais humildes que eventualmente pareçam ser, o que Deus faz na vida de cada um nunca é pequeno ou comum. Pequeno e comum, geralmente é nossa maneira de ver e agradecer. Qualquer texto nascido de uma experiência com Deus é potencialmente explosivo para trazer renovo na vida de alguém do outro lado da tela de um monitor.

Um blogueiro pode, amiúde, "brigar" com a ortografia. O que não justo é manter a inércia. Aos que desejam planejar o próprio crescimento, três ferramentas são imprescindíveis: uma Gramática atualizada, um bom dicionário e a Nova Ortografia da Língua Portuguesa. O importante é manter a chama da visão acesa.

Antes de terminar quer tecer uma séria crítica aos que já aprenderam blogar, fazem parte da comunidade NING da União de Blogueiros Evangélicos, mas não assumem nenhum compromisso com os rumos da comunidade. A conhecida falta de comunicação. E esta crítica é: de forma individual, isolados, nosso potencial de ação é mínimo. Não estou me referindo a uso de qualquer cabresto, mas a outro tipo de compromisso com a comunidade. Mas sem troca de ideias, críticas, informações nenhuma organização evolue, e eu creio que há mais potencial no coletivo do que no singular. Veja o caso das organizações políticas. Elas exercitam constantemente a comunicação e o diálogo como meios para atingir e executar seus propósitos. É muito díficil, mas se eles conseguem é porque a receita funciona.

Os blogs estão brotando às centenas todo dia. aí. A cada mês, somente a UBE recebe cerca de 500 propostas de afiliação. Se tiver uma visão pessimista baseada em falhas e defeitos, não vai mesmo faltar oportunidade para criticar. Mas devo também considerar a hipótese de contribuir para trazer algum equilíbrio na blogosfera. De que vale uma crítica estéril sem algum contrapont? Se por outro lado eu for otimista demais ao ponto de esperar que todo líder evangélico saiba blogar com excelência sem ajuda, é esperar demais.

No entanto, um fato é inegável perfeitamente desejável. Entre a leitura passiva e publicação de conteúdo eu prefiro que todos líderes evangélicos publiquem, posto que para publicar com excelência é preciso de muita leitura. Um cristão tecnologicamente habilitado e perfeitamente contextualizado operando dentro dos propósitos de Deus. Se Deus o colocar por cabeça, no que depender de nós, vamos ajudá-lo a deixar de ser um apêndice.


Mailto me: cruzue@gmail.com



Por que "seu" Mário voltou a morar na Praça da República

.João Cruzué

De vez em quando, como você já deve ter percebido, eu tenho escrevido algumas crônicas sobre o que tenho visto no Centro da Paulicéia, meu novo local de trabalho, desde o início do ano. Hoje eu desejo falar do "seu" Mário, um conhecido morador de rua, que tem seu lar em uma bancada de jardim da Praça da República. Ele foi embora da Praça, mas não conseguiu ficar longe. Seu Mário voltou.

Desde a primeira vez que vi seu Mário não pude mais esquecê-lo. Eu fique asssutado com seus gritos e impropérios. As palavras mais chulas que, talvez você ainda não tenha ouvido, eram ditas a plenos pulmões ofendendo a mãe e toda parentela de transeuntes que o provocavam. Eu percebi que seu Mário, se não era possesso, já era acostumado a emprestar sua boca ao demônio.

Eu fiquei sabendo do seu nome, através de minhas colegas de trabalho. Moças e senhora evangélicas. Administradoras, advogadas, funcionárias públicas. Elas decidiram caminhar pela Praça no intervalo do almoço à procura de alguém para falar do amor de Deus. E foi ali que, na bancada do jardim , na saída do Metrô, atrás do Colégio Caetano de Campos, elas "acharam" seu Mário. Uma pessoa com graduação em Economia, mas morador de rua conhecido e esquecido pela ou da família. Foi o que apuraram.

Eu já sabia de casos e casos de moradores de rua, mas nunca tinha ouvido falar que um morador de rua pudesse ser um economista.

Orando e buscando ajuda, minhas colegas conseguiram um abrigo católico para receber e cuidar do seu Mário. Durante três a quatro semanas os transeuntes da Praça da República notaram a ausência de seu Mário. Quando eu pensei que ele já tivesse encontrado um lar definitivo, ele voltou. Para minha tristeza.

Na semana que seu Mário voltou choveu muito. Ele praticamente fica assentado o dia inteiro no mesmo lugar. E deitado sob um cobertor velho. Mesmo tendo chovido a noite inteira, ao sair do Metrô eu o vi seu Mário no lugar de sempre. Entre o céu e seu Mário o único teto era um cobertor molhado. Ensopado.

Por que seu Mário voltou? Eu não tenho a resposta para esta pergunta. Talvez uma ideia que se aproxime dela. Seu Mário perdeu a noção de família. Aliás, foi perdendo pouco a pouco. Mesmo sendo recebido com muito carinho onde foi acolhido, ele sente saudades da solidão do bancada de cimento no meio da rua. Mas trouxe um costume novo de onde ele esteve pela última vez: não tenho visto ele xingar.

Não sei se foi por problemas mentais (não parece) ou por rabugice extrema. O fato é que, enquanto ele se desgarrava da família, foi se apegando a um endereço na Praça. Um endereço que não tem número, nem porta, nem teto. A esquina de uma bancada de cimento que circunda um canteiro de jardim na Praça. Ele pode se mudar, mas isso pode levar tempo. Não deve ter sido a primeira vez que concordou em ser cuidado em um abrigo de uma instituição religiosa. Católica. Mas eu creio, que entre idas e vindas ele poderá estabelecer novos vínculos de apego em um endereço de verdade.

Eu creio que moradores de rua podem se mudar para lares verdadeiros. Existe um remédio que, se ministrado pelo menos uma vez por semana, durante certo tempo, pode fazer efeito duradouro. É um frasco de amor cristão. Uma única dose pode não ser o bastante para curar, mas se for administrado com teimosia vai tirar muitos "Mários" da rua.

O que fazer se nem todos os cristãos têm ministérios para cuidar de moradores de rua? Talvez investindo em pequenos gestos despretendiosos. Eu descobri que seu Mário gosta de pão-de-queijo. Ou será pão de queijo?

cruzue@gmail.com

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