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sábado, dezembro 20, 2025

Os efeitos dos Pogrons Russos na 3ª Aliá dos Judeus para a Palestina

Pogrons Russos :
destruição de propriedades de judeus

João Cruzué

Os pogroms representam um dos episódios mais sombrios da história judaica moderna e ajudam a explicar, de forma direta, o surgimento da 3ª Aliá. Entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX, comunidades judaicas do Leste Europeu viveram sob a ameaça constante de ataques coletivos marcados por extrema violência. Casas eram saqueadas, sinagogas incendiadas e famílias inteiras massacradas. Mais grave ainda era a percepção de que o Estado, em vez de proteger, frequentemente fechava os olhos ou estimulava indiretamente esses crimes.

O pogrom ocorrido em Kishinev, em 1903, tornou-se um símbolo dessa realidade brutal. Os relatos de mortos, feridos e bairros inteiros destruídos chocaram a opinião pública internacional e produziram um abalo profundo no mundo judaico. A lição deixada por Kishinev foi amarga e clara: a vida judaica na Europa Oriental estava à mercê da violência popular e da indiferença governamental, sem garantias reais de segurança ou justiça.

O pogrom de Kishinev ocorreu durante a Páscoa judaica, em abril de 1903, após a circulação de boatos antissemitas conhecidos como libelos de sangue, que falsamente acusavam judeus de assassinato ritual. Durante dois dias, multidões atacaram sistematicamente bairros judaicos, assassinando civis indefesos, violentando mulheres e destruindo centenas de casas e estabelecimentos comerciais. Estima-se que cerca de 49 judeus tenham sido mortos e centenas feridos, embora o impacto psicológico tenha sido muito maior do que os números sugerem. As forças policiais permaneceram em grande parte inertes, intervindo tardiamente ou simplesmente observando, o que reforçou a percepção de cumplicidade estatal. Kishinev marcou um ponto de ruptura: para muitos judeus, ficou evidente que a violência não era episódica, mas estrutural, e que a permanência naquelas sociedades significava viver sob ameaça permanente.

Nos anos seguintes, a situação piorou. A Revolução Russa de 1905 e, posteriormente, a Guerra Civil Russa, entre 1918 e 1921, mergulharam a região no caos. Milícias armadas, tropas irregulares e facções políticas rivais transformaram comunidades judaicas em alvos recorrentes. Milhares de judeus foram mortos, e incontáveis outros perderam tudo o que possuíam. Para muitos, tornou-se impossível acreditar que a emancipação jurídica ou a assimilação cultural fossem capazes de protegê-los da perseguição.

É nesse cenário de medo, luto e desesperança que se forma a 3ª Aliá (1919–1923). Diferentemente de ondas migratórias anteriores, ela foi composta majoritariamente por jovens profundamente marcados pela violência dos pogroms. Esses imigrantes não partiam apenas em busca de melhores condições econômicas, mas movidos pela convicção de que a sobrevivência do povo judeu exigia uma solução coletiva, concreta e duradoura.

Os pogroms atuaram, assim, como um poderoso fator de expulsão e, ao mesmo tempo, como um impulso ideológico. Ao demonstrar os limites da convivência segura na Europa Oriental, fortaleceram o sionismo como resposta prática à perseguição. A Palestina passou a ser vista não apenas como uma promessa histórica ou religiosa, mas como um espaço onde os judeus poderiam reconstruir suas vidas com autonomia, trabalho próprio e autodefesa.

A criação dos kibutzim (em hebraico, קיבוץ, “coletivo”) foi uma das expressões mais concretas do espírito da 3ª Aliá. Para os pioneiros — os halutzim (חלוצים) — o assentamento agrícola comunitário não era apenas uma forma de sobrevivência econômica, mas um projeto ético e nacional. Inspirados por ideais de igualdade e cooperação (שיתוף – shituf), eles defenderam a avodá ivrit (עבודה עברית, trabalho judaico) como meio de reconstrução da dignidade após os pogroms. Cultivar a adamah (אדמה, a terra) com as próprias mãos simbolizava romper com séculos de marginalização e dependência. Nos kibutzim, a vida coletiva, a partilha dos bens e a educação comum buscavam formar um “novo judeu”, livre do medo, capaz de se defender e de construir o futuro com autonomia.

Resumindo, os pogroms não foram apenas antecedentes históricos da 3ª Aliá, mas seu principal motor. Eles romperam definitivamente a ilusão de segurança na Europa Oriental e empurraram uma geração inteira para a ação histórica. A 3ª Aliá canalizou dor e medo em construção — especialmente por meio dos kibutzim — lançando bases humanas, sociais e institucionais que seriam decisivas, anos mais tarde, para a formação do Estado de Israel.

Livro recomendado: Israel - uma História, por Anita Shapira

SP- 20/12/2025.