Photo: Daylife
A luz da queima do crack
JOÃO CRUZUÉ
Reportagem/Olhar/ 28.08.2010.
Diga-me com sinceridade, diante da ação da sociedade e dos poderes constituídos, inclusive o religioso, você vê alguma perspectiva promissora de combate e vitória sobre as cracolândias que estão brotando neste momento pelo Brasil?
Na minha opinião, todos nós precisamos fazer uma releitura daquele famoso sermão do Pr. Martin Luther King, chamado Redescobrindo os Valores Perdidos .
* Noia é nome do usuário de crack.
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Reportagem/Olhar/ 28.08.2010.
SÃO PAULO - Até o final dos anos 80s, a região próxima à Estação da Luz, compreendida pelo polígono das Avenidas Duque de Caxias, Barão do Rio Branco, Ipiranga e Rua Mauá, formava a zona de meretrício conhecida como "boca do lixo". De uns 20 anos para cá aquele lugar se tornou o berço da cracolândia, um portal do inferno de onde saíram os demônios para desgraçar milhares de vidas, não importa em que berço nasceram.
Com a perda gradual do fluxo de viajantes que antes desciam na Rodoviária velha, Estações Júlio Prestes e Luz, a "boca do lixo" minguou. O "mercado" do meretrício foi sendo substituído a partir dos anos 90s, pela "boca de fumo" do crack - uma nova e devastadora droga feita com restos de cocaína e bicarbonato. No plano espiritual, um velho processo demoníaco de destruição foi substituído por outro muito mais destrutivo, que reage contra os poderes público e religioso que não sabem como, nem encontram as armas para enfrentá-lo. A cracolândia está saindo da "boca do lixo" para se tornar hoje um fenômeno nacional - de São Paulo para todas as grandes, médias cidades brasileiras.
Com a perda gradual do fluxo de viajantes que antes desciam na Rodoviária velha, Estações Júlio Prestes e Luz, a "boca do lixo" minguou. O "mercado" do meretrício foi sendo substituído a partir dos anos 90s, pela "boca de fumo" do crack - uma nova e devastadora droga feita com restos de cocaína e bicarbonato. No plano espiritual, um velho processo demoníaco de destruição foi substituído por outro muito mais destrutivo, que reage contra os poderes público e religioso que não sabem como, nem encontram as armas para enfrentá-lo. A cracolândia está saindo da "boca do lixo" para se tornar hoje um fenômeno nacional - de São Paulo para todas as grandes, médias cidades brasileiras.
Em 1978, Caetano Veloso escreveu os versos de SAMPA. "Alguma coisa acontece no meu coração/que só quando cruzo a Ipiranga e a Avenida São João"... Ele também disse: "da feia fumaça que sobe apagando as estrelas". Se ele voltasse ao mesmo local em 2010, não iria mais encontrar a "deselegância discreta das tuas meninas", mas grupos de "noias" maltrapilhos perambulando pela noite à volta daquela esquina. Também iria ter uma grande surpresa sobre a "fumaça que encobria as estrelas". Hoje as "estrelas" brilham no chão da cracolândia pela luz dos isqueirinhos baratos acendendo o crack.
Em 2005, o prefeito da cidade de São Paulo, Sr. Gilberto Kassab, anunciou um plano novo de revitalização para o entorno da Estação da Luz. E para construir um factóide publicitário, mandou demolir um prédio velho, que ele considerava o símbolo da cracolândia. Assim o prefeito "decretou" o fim da cracolândia.
Mas a cracolândia transcende o plano físico tendo suas raízes no mundo espiritual. É mais forte que a organização do poder público. Ela não foi destruída; nem se tornou uma "página virada" como afirmou Kassab de volta ao local em 2007. Ao contrário, a publicidade produziu sua expansão. Sua globalização. A cracolândia paulistana agora é conhecida da imprensa mundial e as fotos dos viciados e os uploads no YouTube de "noias" acendendo o crack em seus cachimbos correm o mundo.
Se antes a presença dos "noias" (como são chamados os usuários de crack) era restrita ao endereço antigo, hoje eles podem ser vistos, em bandos ou em pequenos grupos, à noite, por todo o Centro de São Paulo. Eles estão na Rua 7 de Abril; na Av. São Joao em frente ao Edifício Andraus - sede da Secretaria de Finanças da Prefeitura de São Paulo; na Av.São João - em frete à sede mundial da Igreja Internacional da Graça de Deus; no Largo São Francisco - à frente da maior Faculdade de Direito do país; no Pátio do Colégio - onde se iniciou a grande Metróle, na Praça da Sé - sede do poder religioso romano, na Rua José Bonifácio, nas ruas próximas ao Parque Dom Pedro, debaixo dos viadutos, no começo da Avenida 9 de Julho, ao lado da Casa do Pequeno Trabalhador. Até na porta da loja do Pastor Silas, no Prédio do Tribunal de Alçada Civil, na Praça Padre Manoel da Nóbrega, tenho visto viciados dormindo. Na praça Princesa Isabel, debaixo das marquises da Primeira Igreja Batista de São Paulo - também!
Poucos podem estar apercebidos, mas o que Deus está falando com a sociedade através da presença destas infelizes criaturas deitados à porta destas instituições?
Ao ser fustigada pelo poder municipal, ela foi buscar novas áreas. Como um bolo do centro para às bordas, a Cracolândia está "povoando" todas as ruas e avenidas do Centro de São Paulo. Ano passado, ao atravessar a Praça da República pelo meio do parque, em frente a uma escola pública, passei junto a uma "nuvem" de adolescentes em completo frenesi; à luz do meio-dia, porque o crack acabara de chegar. Foi uma visão de algo indescritível. Quem vê, mesmo que não queira, vai me dar razão, quando eu digo que o efeito pré e pós crack é um quadro vivo do inferno. Um processo demoníaco de destruição humana.
A cracolândia é um processo demoníaco porque o poder público é impotente para tratar o viciado. Primeiro porque as leis não permitem que uma pessoa possa ser tratada sem sua aquiescência. Segundo porque ela nunca vai querer sair deste processo cego. Está sendo destruída em vida, mas seus sentidos físicos lhe enganam. Ela se sente no céu, queimando viva no inferno. A publicidade o poder público paulistano lhe deu tem dois efeitos: horror e curiosidade. O "anzol" do crack sempre fisga na primeira "beliscada" diferentemente das outras drogas, onde a dependência é tardia.
Tratar viciados em crack não dá ibope para Igrejas Evangélicas do Centro de São Paulo. Elas criam projetos para a Cracolândia, mas não há investimentos e talvez não funcione, porque depende da vontade do viciado querer ou não, se tratar. Por enquanto ainda não surgiu nenhum "David Wilkerson" para enfrentar Cracolândia de dentro para fora, a partir do reino espiritual. Minha formação pentecostal me diz que este processo demoníaco é organizado e mantém um projeto de alcance nacional. Uma cracolândia em cada grande cidade deste país.
Esta a minha percepção. Trabalhei no Centro de São Paulo na década de 70, 80 e voltei a trabalhar ali nesses últimos dois anos.
Se não houver alguma mudança nas leis deste país que possibilite a internação compulsória de usuários de crack, o poder público vai continuar de mãos atadas. Se as Igrejas deixarem um pouco de lado a política e voltarem a praticar a solidariedade e o amor quem sabe teremos a solução para estas mazelas?
A cracolândia está em franca expansão. Ela é uma resposta ao materialismo social, à insensibilidade das Igrejas, à corrupção e fisiologismo dos políticos e ao esquecimento dos valores cristãos.
Recentemente (final de 2012) o Governador Alckmin concebeu um projeto para internar compulsoriamente e tratar dos noias que perderam o controle de suas vidas. A procura foi tanta e o que o governo tinha a oferecer era tão pouco, que a boa notícia se converteu em uma grande frustração, tanto para viciados que procuraram por ajuda, quanto por familiares que buscavam tratamento para seus entes.
Recentemente (final de 2012) o Governador Alckmin concebeu um projeto para internar compulsoriamente e tratar dos noias que perderam o controle de suas vidas. A procura foi tanta e o que o governo tinha a oferecer era tão pouco, que a boa notícia se converteu em uma grande frustração, tanto para viciados que procuraram por ajuda, quanto por familiares que buscavam tratamento para seus entes.
Na minha opinião, todos nós precisamos fazer uma releitura daquele famoso sermão do Pr. Martin Luther King, chamado Redescobrindo os Valores Perdidos .
* Noia é nome do usuário de crack.
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