sexta-feira, março 08, 2019

Abuso sexual e o perdão de Deus

.


Por João Cruzué


Eu não posso curar as feridas nem acabar com as cicatrizes  da alma de uma mulher que passou pelo suplício de um abuso sexual, mas eu conheço alguém que pode. Há muitos anos, vou contar neste post, estive diante de uma cena inesperada que me deixou uma inesquecível lembrança. O perdão é mais forte que o abuso e o ódio a pior forma de tratar o problema. No final do texto, vou orar por você, que de alguma forma anda em busca da voz de Deus para curar sua dor.

Amanhá será comemorado o Dia Internacional da Mulher em 2019. É claro, que seria muito mais discreto e apropriado falar sobre a beleza, inteligência e conquistas da Mulher na sociedade brasileira. Todavia, embora seja espinhoso o assunto, quero escrever algumas palavras, desejando que elas sejam úteis nas mãos de Deus para abençoar e mudar a vida de uma mulher que foi abusada sexualmente na infância ou na juventude. Sei que é preciso um milagre para perdoar e esquecer. Isto é possível? Sim!

"O profeta Zacarias escreveu sob a unção de Deus este texto curioso:"E se alguém lhe disser: Que feridas são essas nas tuas mãos? Responderá ele: São as com que fui ferido na casa dos meus amigos" (Zc. 13.6).
 Como pode ser isto: ser ferido na casa de amigos? A Bíblia Sagrada mostra que este assunto diz respeito ao martírio de Jesus Cristo, determinado pelos  líderes religiosos da sua época, gente que tinha no coração uma serpente em lugar do Espírito de Deus.

A única arma que pode combater a dor de um - ou vários - abusos é o perdão. Podemos não ter esta capacidade, mas podemos orar para alcançá-la. Assim está escrito: "Porque para Deus nada é impossível" (Lucas. 1.37).

Na sociedade brasileira, infelizmente, é muito frequente o abuso sexual do pai contra a filha ou enteada. Há filhas que tiveram filhos do próprio pai. Segredos guardados com muitas chaves e como muita dor no coração.  Marcas que não saem com cirurgias plásticas pois não são visíveis aos olhos. 

Como disse no início, nos anos em que servi como pastor de uma congregação da Igreja Evangélica Assembleia de Deus, fui convidado por uma família para realizar a cerimônia de um culto em um velório. No caixão estava o corpo de um senhor de seus 70 anos e, à volta, duas moças muito bonitas com os olhos cheios de lágrimas. Já tinha ouvido falar do caso. As duas tinha sido vítima de estupro do próprio pai.

Eu não tenho memória fotográfica. Longe disso, sou pouco detalhista. Mas, naquele dia eu vi e gravei bem uma cena. A moça olhando para o corpo daquele pai. Em seu rosto não dava para perceber sinais de ódio. Tinha um olhar amoroso e o rosto molhado de lágrimas.  Não tenho a certeza de que conseguiram perdoar, mas, tenho para mim que o fizeram, ou que buscavam fazer isso, de outra forma nem teriam ido ao velório e sepultamento.

Quando Deus fez a mulher para ser companheira do homem, deu-lhe dons e capacidades especiais. Por exemplo, é mais sensível, bela,  alegre, sociável e perdoadora do que o homem.  Na Igreja atual, quem mais ouve a voz de Deus não são os homens. Vejo a liderança nas mãos deles, mas  elas são quase 2/3 (dois terços) dos membros. Deixemos, de lado, estas estatísticas.

É possível perdoar e depois esquecer? Sim. No livro do profeta Isaías, Deus disse assim: "Eu, eu mesmo, sou o que apaga as tuas transgressões por amor de mim e dos teus pecados me não lembro (Is. 43;25). Esta promessa está repetida pelo profeta Jeremias, no capítulo 31, vv 31 -34.

Por que Deus nos daria uma promessa de perdoar nossa maldades e não guardar nossos  pecados em sua lembrança? Porque Deus é amor. Jesus é a expressão do amor de Deus, perdoando, curando, sarando, libertando, alegrando e concedendo um nova oportunidade.

A falta de perdão é como a corrente que prende o ser à causa da sua dor. O perdão é o ato que liberta quem o dá, muito mais do que aquele que recebe. Isto está escrito na Bíblia. Segundo o apóstolo Paulo, Jesus disse "Mais bem-aventurada coisa é dar do que receber."

Enquanto você guardar a dor do estupro em seu coração as correntes do inferno vão continuar mantendo você infeliz e doente. Não haveria lógica em perdoar, a não ser que o perdão desaparece com a tristeza e abre a porta da alegria. Quando você obedece a ordem de Cristo para perdoar, e perdoa ou procura forças em Deus para perdoar, o Espírito da alegria de Deus bate à porta do seu coração. Quando o perdão sai, o Espírito Santo entra. Quando o perdão é negado,  você continua presa pelas correntes do diabo.

Se você quiser experimentar o tamanho da alegria de Deus, perdoe. Descubra como perdoar. Ore a Deus para aprender a perdoar. 

Se perdoar fosse ruim, Jesus Cristo não teria ensinado tanto sobre o perdão. Por fim, a falta de perdão mata, adoece e leva ao inferno.

Agora vamos deixar de lado a lógica e os conceitos racionais para explorar os campos da fé.  Olha que palavras maravilhosas existem na Palavra de Deus. Podemos fortalecer nosso espírito, lendo e as guardando em nosso coração.

1. O amor tudo sofre, tudo crê. tudo espera, tudo suporta. O amor nunca falha (I Cor. 13; 7-8);
2. Perdoar, para que não sejamos vencidos por satanás (II Cor. 2;10);
3.  Pois Deus não nos deu um espírito de covardia, mas de fortaleza, amor e temperança  (II Timóteo, 2:7);
4. E, uma coisa faço, e é que me esquecendo das coisas que para trás ficam, e olhando para as que estão adiante de mim, prossigo para o alvo, pela soberana vocação de Deus em Cristo Jesus (Filipenses 3; 13-14);
5. Bem-aventurado os que choram, porque eles serão consolados (Mateus 5:4);
6. Porque Deus amou o mundo de tal maneira, que deu seu o seu filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna (João 3:16)
7. Quem crê em mim [disse Jesus], com diz a Escritura, rios de água viva correrão do seu ventre. E disso isso do Espírito [Santo] que haviam de receber os que nele cressem (João 7: 38-39).

O que quer dizer esta frase: "Rios de água viva correrão em seu ventre"?  Isto fala da imensa alegria que você pode sentir em seu coração, se ouvir as sua voz, dizendo para você perdoar. Essa alegria indescritível e incomensurável a a presença do Espírito Santo habitando no coração de uma pessoa que ouve e obedece a voz de Deus.

Faça um concerto com Deus. Reconcilie-se com Ele. Convide Jesus para morar no seu coração e lhe dar a capacidade de perdoar a pessoa que lhe trouxe tanta infelicidade. 

Se você crer nesta palavra, reconciliar com Deus,  perdoar de coração aquela pessoa àquela pessoa que o diabo usou para destruir a sua vida, uma coisa maravilhosa vai acontecer. Um dia, quando você menos esperar, você vai estar na sua casa, lavando os pratos na cozinha, ou caminhando na rua, ou dentro do ônibus, a pessoa do Espírito Santo vai entrar no seu coração e ele vai transbordar de alegria. Será algo tão grande, tão maravilhoso, que depois disso você nunca mais sentirá a dor do abuso. 

Minha oração por você: Senhor Jesus, eu sei que vais cumprir esta promessa na vida desta mulher, que chegou aqui trazida por Ti, e acabou de ler esta mensagem. Ajude-a perdoar e a receber a maravilhosa alegria do batismo no Espirito Santo. Obrigado, Senhor. Amém.

Com amor, 
do seu irmão em Cristo, 
João Batista Cruzué


.







quinta-feira, março 07, 2019

Jesus com as Mulheres


Jesus escrevendo na areia

Autor: Paulo Brabo


"–Está vendo essa mulher?

Eu entrei na sua casa e você não me ofereceu

água para lavar os pés.

Ela, no entanto, lavou meus pés com lágrimas,

e enxugou-os com os seus cabelos.

Você não me cumprimentou com um beijo,

mas ela, desde que entrou,

não parou de beijar-me os pés.

Você não me derramou óleo sobre a cabeça,

mas ela passou essência perfumada nos meus pés.
"
 

Lucas 7:44-46



A distância cultural nos impedirá para sempre de apreender a extensão da sua influência e a absoluta novidade da sua postura, mas é certo que nenhuma outra figura masculina da antiguidade oriental – seja no domínio da realidade ou da ficção – sentiu-se mais à vontade entre as mulheres do que o Jesus dos evangelhos. Nenhum outro personagem do seu tempo, e talvez de tempo algum, fez mais para corrigir a distorção das lentes culturais através das quais a imagem da mulher era interpretada – e em muitos sentidos permanece sendo.

A singularidade de Jesus nesse aspecto não é menos do que tremenda. Acho notável ao ponto do milagroso que as posturas de Jesus diante das mulheres, conforme descritas nos evangelhos, não tenham sido censuradas posteriormente por homens menos preparados do que ele para abraçá-las.


É preciso lembrar o óbvio, que não faz cem anos que as mulheres alcançaram status social igualitário no ocidente, o que os evangelhos descrevem que ocorreu há dois mil.


Numa época em que um marido não deveria se dirigir à própria esposa em lugar público, e que homem algum deveria trocar palavra com uma mulher desconhecida (em ambos os casos para proteger a sua honra, não a dela), o rabi de Nazaré buscava a companhia amistosa de mulheres, puxava conversava com elas, tratava-as com admiração e naturalidade, interessava-se sem demagogia pelos seus interesses, deixava que tocassem publicamente o seu corpo e o seu coração.


O Filho do Homem não se constrangia em ser sustentado por mulheres, não virava o rosto à possibilidade de ser acarinhado por elas, não hesitava em recorrer a imagens que diziam respeito ao seu dia-a-dia, não sonegava histórias em que mulheres eram (muito subversivamente, na ótica do seu tempo) exemplo de humanidade, de integridade, de engenhosidade e de virtude.


Falamos de um tempo, num certo sentido não muito distante, em que os homens que não denegriam abertamente a imagem da mulher soterravam-na por completo debaixo de idealizações simplistas. Dependendo de quem estivesse falando, a mulher era vista como incômodo necessário, como homem imperfeito, como criança, como objeto mecânico de desejo, como objeto idealizado de poesia, como animal fraco e sensual; figura às vezes inocente, às vezes desejável, normalmente imprevisível, normalmente indigna de confiança e invariavelmente inferior.


Contra esse cenário, o rabi de Nazaré resgatou uma mulher adúltera das garras da justiça e da morte sem recorrer ao que seria o mais fácil e popular dos argumentos antes e depois dele, o que afirma que a mulher é criatura de mente obtusa e vontade fraca, particularmente suscetível às sensualidades da  carne. Em um único golpe eficaz ele transferiu a culpa da mulher, acuada para seus acusadores, todos eles homens, emblemas de poder e desenvoltura, até serem publicamente dissolvidos pela mão de Jesus. A vítima, transgressora, foi ao mesmo tempo salva da condenação e tratada, talvez pela primeira vez, como um ser humano independente e responsável (João 8:1-11).


Aqui estava um homem que, irresistivelmente, olhava para as mulheres sem rebaixar-se a preconceitos ou recorrer a idealizações. Jesus lia as mulheres como seres humanos, e foram necessários séculos para que o mundo arriscasse repetir a sua ousadia. Ainda hoje, transcorridos milênios ineficazes, não há homem que esteja imune a ler a mulher através de estereótipos novos e velhos; ainda somos tentados a enxergar o homem incompleto, a flor de pureza, a criança sem rédea. Mas ali, nas esquinas empoeiradas de um canto do mundo, as estruturas do mundo social haviam sido abaladas para sempre.


Para mim não há evidência maior de que o espírito subversivo de Jesus permaneceu vivo nos primeiros discípulos, logo após a ressurreição, do que a descrição da comunidade de seguidores em Atos 1:14: “Todos estes [homens] perseveravam unanimemente em oração, com as mulheres, e Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos dele”.


Este com as mulheres me pega desprevenido todas as vezes, tanto pela sua necessidade quanto pelo impensável que representava no seu tempo. Em retrospecto é difícil avaliar o quanto está sendo efetivamente dito aqui, mas é preciso lembrar constantemente que naquela cultura as esferas de atividade de homens e mulheres eram divididas ao ponto do incompatível. Essa fenda corria de uma ponta à outra o tecido da sociedade, mas seu ponto nevrálgico talvez residisse na esfera religiosa, na qual era preciso ser homem para ter participação eficaz – isto é, para ter acesso verdadeiro e relevante à divindade.


Na visão de mundo vigente, homens e mulheres habitavam espaços separados no universo; essa incompatibilidade era espelhada na sociedade e prontamente celebrada através de espaços diferenciados de adoração. Tanto o Templo quanto as sinagogas tinham áreas separadas para homens e mulheres, e os recintos reservados para os homens ficavam invariavelmente mais próximos de Deus. Era uma sociedade em que não ocorreria a ninguém colocar homens e mulheres compartilhando voluntariamente de um mesmo espaço, muito menos um espaço religioso.


Agora que Jesus havia subido ao céu e os homens de branco haviam dito que mantivessem os olhos fixos na terra, os discípulos viram-se diante de um problema e de um embaraço. Jesus, o amigo das mulheres, havia partido, mas as mulheres haviam ficado. Deveriam eles, homens de respeito e maridos de boa fama, retornar ao antigo e unânime padrão social, devolvendo as mulheres ao seu devido lugar? Agora que Jesus não estava mais ali para efetuar a sua mágica, não seria inevitável que restabelecessem a fenda social que ele havia coberto temporariamente? Quando a multidão de seguidores retornasse a Jerusalém (onde Jesus dissera que aguardassem) deveriam o grupo de discípulos e o de discípulas “perseverar unanimemente” em recintos separados?


Escolher o contrário, escolher o abraço comunitário e a convivência santa nos padrões inaugurados por Jesus, seria nadar contra a corrente de todas as instituições sociais em efeito no seu tempo. Um observador só encontraria um modo razoável de interpretar uma reunião voluntária e regular entre homens e mulheres: como ocasião para licenciosidade. Foi efetivamente dessa maneira que as reuniões cristãs “de amor” foram interpretadas por seus antagonistas ao longo de seus primeiros séculos. Tinham que ser desculpas para sexo – porque, que mais poderia um homem querer fazer com uma mulher?


A momentosa decisão encapsulada nesse único verso demorou a encontrar compreensão e aceitação, tanto dentro quanto fora do grupo. Escolhendo reunir-se regularmente no mesmo recinto, tanto homens quanto mulheres abriram voluntariamente mão da ficção da “boa fama” em troca da generosidade, da inclusão e da convivência. Escolhendo sentar-se de modo criativo ao lado de um Outro com quem não criam ter nada em comum, romperam um véu ancestral e convidaram o mundo a explorar um universo de possibilidades inimagináveis. Nos dois casos, seguiam o desafio formidável deixado pelo exemplo de Jesus.



Fonte: Bacia das Almas - Paulo Brabo




.