domingo, abril 09, 2017

A Santa Ceia e o Lavapés

Lavapés
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Por João Cruzué.
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O texto do Evangelho de São Marcos, capítulo 14:12-26, é muito parecido com o  texto do mesmo assunto em Lucas 22:7-23. Já o Evangelho de São João conta um detalhe que os outros três autores não registraram. É o que veremos adiante.

Os evangelistas Lucas e Mateus registraram que os discípulos foram instruídos  por Jesus Cristo para encontrar um lugar especial para celebrar a Páscoa. Desta instrução constava um sinal, que era o de procurar por um homem que levava um cântaro d'água.  Mateus não cita tal detalhe. João, também, não.

Mas João aprofundou-se em outros detalhes. Ele ele deixou implícito no texto que os 12 discípulos celebraram a páscoa com os pés sujos. Em complemento do assunto, em Lucas 22:24-30 transparece com muita sutileza uma certa contenda que teria surgido no início da celebração. O texto fala de uma disputa entre eles de quem seria o maior. Na verdade, estavam procurando eliminação o menor, para que este fizesse o serviço mais baixo que era o de lavar os pés dos "maiores". Como não chegassem a um consenso, participaram da ceia com os pés sujos.

Também, o texto de Mateus 18 parece tratar de outro registro do mesmo assunto. Também estavam procurando quem seria o menor entre eles, para que este servisse os outros 11, lavando-lhes os pés. Culturalmente, lavar os pés era uma atribuição para os criados da casa. Neste registro,  Jesus entra em cena e toma uma criança, põe-na no meio deles e dá uma boa descascada: Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e não vos fizerdes como crianças, de modo algum entrareis  no  Reino dos céus.

A esta altura, parece-me que o cântaro e sua água estivessem ligados à lição do lavapés. E, neste sentido, o detalhe que os três escritores não mencionaram, João registrou no capítulo 13:1-20.

Por não terem chegado a um consenso, os discípulos desistiram de lavar os pés ao se sentarem no chão para celebrarem a última Páscoa com a presença de Jesus. Todo mundo era "grande". Ninguém quis se rebaixar  ao nível de um criado da casa para lavar os pés. Imagino que depois de terem caminhado muito durante o dia, assentar-se no chão com os pés sujos não deveria ser muito confortável.

Jesus esperou que a celebração da Páscoa terminasse para ensinar humildade e serviço aos 12 discípulos. Como ninguém queria se rebaixar à condição de criado, depois de ter ceado, Jesus tirou uma toalha entre suas vestes e chamou, um por um, os discípulos e lavou-lhes os pés.  Foi uma lição inesquecível.  

O ambiente daquela Páscoa corria com relativa tranquilidade, até o momento que o Senhor falou em alto e bom som que um dos 12, que metia a mão no prato junto com ele, era um traidor. A partir daí, a tristeza, como uma nuvem cinzenta, pairou sobre o cenáculo. Como ninguém conhecia o traidor, ou uma pergunta recorrente: Por ventura sou eu, Senhor?  A seguir, veio a lição de humildade. O Maior colocando-se na posição de criado e colocando um novo conceito de grandeza: Quem quiser ser o maior no Reino dos Céus, que então sirva os irmãos. Foi assim que o Senhor destroçou a hipocrisia deles, com uma lição infalível. Por fim, um tristeza completa inundou o ambiente, com o desmascaramento de Judas.

Espiritualizando.

O que significaria a  sujeira dos pés em um corpo de um discípulo que já estava com o corpo limpo? isto eu não o sei, mas posso conjecturar. Eles cearam com os pés sujos, porque não queriam servir. Por este lado, o desejo de ser  o "maior", revelava um desconhecimento  enorme dos discípulos sobre o que ser um servidor do Cristo. Ao tomar a toalha para lavar a poeira dos pés aos apóstolos, Jesus estava dizendo duas coisas: que o cristão deve servir como seu Mestre. Que a celebração da Ceia foi tudo, menos alegre. Ali aconteceram dois fatos: a exposição da hipocrisia e a revelação da existência de um traidor.

O poeira dos pés para mim, simboliza a necessidade da graça de Deus todos dias, porque não conseguimos fazer todo o bem que devemos durante as 24 horas do dia. 

Também, para mim, esta poeira é parte da cultura mundana, da cultura humanista  já denunciada por Martin Luther King. Praticar a corrupção sem que ninguém percebesse era coisa dos mais espertos. Até hoje esta iniquidade é considera por baixo dos panos como um "virtude". Pela cultura mundana de nossa época é vergonhoso servir e apreciável o mandar, exercer autoridade sobre outros.

A poeira dos pés é uma sujeira inevitável. Basta colocar o pé na rua, para sujá-lo com a poeira. Também poderia significar orgulho, soberba e preconceito. Orgulho, por não querer servir. Servir era coisa de criados, servos e escravos. Todos os 12 queriam ser servidos. Como o lavapés somente aconteceu depois de terem ceado, fica evidente que eles participaram da santa ceia de modo indigno aos olhos de Jesus Cristo. Tanto foi assim que o Mestre não deixou o assunto da sujeira sem água. Tomou a toalha, cingiu-se e começou a lavar pés de cada um, a começar pelos pés de Pedro.

Também mostra que o Senhor não gosta de sujeira de nenhum tamanho. Inclusive da pequena sujeira. 

Também não aceitou que os apóstolos terminassem a celebração da Páscoa com sujeira nos pés. 

Jesus era amoroso. Seu amor foi demonstrado pela postura de humildade. Pelo desejo de servir e ajudar seus discípulos a desvencilharem-se da herança cultural romana. Pequenas iniquidades que passariam despercebidas, ou mesmo que um pastor da época considerasse como "não faz mal".

Depois do lavapés, os discípulos foram para casa envergonhados, por participarem da celebração com os pés sujos. Por terem se recusado a servir uns aos outros, por pura soberba.

O cântaro, a Santa Ceia, a água e a atitude de Jesus. Um coração como de criança é o padrão para ser aceito a entrar no reino de Deus. Uma das coisas que estava implícita naquele episódio era a falta de perdão. O lavar os pés uns aos outros fala justamente de perdão. Naquela disputa de quem seria o maior, e que posição e honrarias teria cada um, discussão de direitos e posição no Reino de Deus, fez com que alguns deles se indispusesse uns com os outros.

Por fim, aquela celebração de Páscoa mostrou que por mais que seja o homem limpo, ele sempre carrega alguma mancha  u mau cheiro que necessita da graça de Deus para para ficar limpo.

Nossa atual geração não nasceu para servir. Querem mandar e ser servidos. Estou falando, principalmente, de Pastores, Bispos, Apóstolos e afins. 

Esta atitude arrogante, independente, precisa sair  da minha e da sua vida, para receber com dignidade que possamos receber o tratamento  de seguidor de Cristo. A letra pode até induzir o homem ou a mulher a pensar que a graça de Deus é um benefício comum e ordinário, mas não é. Ao lavar os pés de cada um, os grãos de poeira de todos  foram descartados. Se nossos pés não forem lavados, Jesus disse que não temos parte com Ele. 

Senhor Jesus, tenham misericórdia de nós.


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A rede no lado direito do barco

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Lago da Galileia
João Cruzué

O capítulo 21 do Evangelho São João é muito especial para os servos de Deus, que uma vez receberam a chamada ministerial.  Sete discípulos, a poucos dias de receber o apostolado, estavam passando por um período de falta de orientação espiritual. E a experiência por que passaram não deixou mais dúvidas, principalmente no coração de Pedro.

A pescaria durou a noite toda. nada apanharam. Aqueles homens tinham famílias, ainda não tinham sustento da Igreja. A atividade da pesca era a forma de garantir o peixe cotidiano, para esposas, sogras, filhos, vizinhos, a parentela. A vida continuava.

-- Filhos, tendes alguma coisa par comer?

--Não!

-- Lançai a rede à direita do barco e achareis.

Quando Pedro disse que iria pescar, foi acompanhado pelos outros seis. Não tinha se esquecido do compromisso com Jesus, mas não sabiam o que deveriam fazer naqueles dias. Principalmente Pedro.

A mesma rede, o mesmo barco e o mesmo Lago de Tiberíades. Sob a ordem "lançai", um cardume de 153 grandes peixes  se formou à direita do barco à espera da rede. A mesma voz que  falava com os homens, comandava peixes.

Por que os sete pescadores passaram a noite inteira trabalhando e nada conseguiram? Atrevo-me a dizer que estavam fazendo certo a coisa: lançando a rede. Fazer certo é diferente de fazer certo a coisa certa. Jogo de palavras para comparar eficiência com eficácia. Para pescar era preciso um barco e uma rede. Mas, para apanhar os peixes era preciso lançar a rede sobre um cardume. 

E os pescadores foram abençoados porque precisavam sustentar suas famílias. E quando o dia raiou não tinha apanhado nem um peixe sequer. Mas, eis que o Senhor apareceu e mandou lançar de novo a rede à direita do barco e ela se encheu.

Nós podemos ficar muito frustrados, mesmo sendo servos de Deus. Não basta só uma rede e um barco para pegar muitos peixes. Na pressa de fazer muitas coisas, corremos o risco de frustração, se não considerarmos a vontade de Deus. Uma vez salvos e servos de Cristo, nada deve ser mecânico: eu vou, eu faço e eu consigo. Não! Agora não deve ser mais assim. Temos que consultar o Senhor, como fazia Davi antes de definir o planejamento da guerra contra os filisteus.

Fazer a coisa certa, mas fora da vontade de Deus. O Rei Saul era useiro e vezeiro de agir assim. Toma a frente de Deus e até mudava as ordens dele, e depois racionalizava com justificativas esfarrapadas.

--Senhor, hoje nós precisamos pescar para ter o peixe na mesa de nossas famílias amanhã. Foi esta oração que o Apóstolo João registrou no Evangelho? Não!  Às vezes, fazer  uma coisa parece tão óbvio, que julgamos não haver a mínima necessidade de orar. Mas, estas obviedades podem trazer muitos transtornos. 

Estar no lugar errado na hora errada, pode, sim, ter consequências muito graves. Você sabe o que quero dizer. Então, é melhor acostumarmo-nos a depender de Deus e orar, até mesmo diante das coisas simples. 

Quando o Senhor perguntou três vezes: "Pedro, tu me amas?" estava chamando a sua atenção para uma mesma falha. A questão da profecia do cantar do galo e do impulso de subir no barco para ir pescar. Na primeira vez, Pedro não considerou a possibilidade de sua coragem falhar. Na segunda, também não imaginava que a pescaria também poderia fracassar.

Não podemos sair vitoriosos de uma empreitada se não considerarmos primeiro o Deus quer de nós. Isto tem a ver com nossa chamada ministerial.  Pedro tinha um chamado e uma missão. Se ele servisse ao SENHOR no ministério, o SENHOR sustentaria a casa de Pedro. De João, de Antônio, de José...

A questão é:  se somos cristãos, devemos submeter nossos planos a Cristo. Será que, se Pedro tivesse reunido os outros seis, e antes de ir para o lago tivessem pedido a bênção do SENHOR, pescariam a noite inteiro sem ter pegado nem um peixe?

Nos dias de hoje, você faria do mesmo jeito?