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segunda-feira, junho 13, 2016

A Vale, a Samarco e o velório do Ribeirão do Carmo

Casa perto do Ribeirão do Carmo no Córrego do Bubu
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POR: JOÃO CRUZUÉ
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Eu conheci o Ribeirão do Carmo em 1965, quando tinha nove anos. Embora tivesse nascido ao lado dele, fui embora aos seis meses de idade. Minha viagem de volta foi cheia de aventuras, apesar de poucos dias, guardei lembranças que ainda perduram por 50 anos. Assim como existe aquele Livro "O Velho e o Mar", vou parodiar o assunto com "O menino e o Rio". Esta história, recentemente, teve um final triste, porque a  Companhia Vale do Rio Doce, disfarçada de "Samarco" acabou com a vida existente na metade da extensão do Ribeirão do Carmo.

Antes de reclamar do assunto, quero dizer uns desaforos. Assim como o ouro de Minas Gerais foi surrupiado pelos portugueses e acabou no bolso dos ingleses, as montanhas mineiras de hematita estão indo embora a preço de banana. Preço de banana, não! Depois deste mar de lama que desceu da barragem de Bento Rodrigues, o prejuízo ambiental foi tanto, que 100 anos de exportação de minério não vai conseguir recuperar. "Parabéns!" Companhia Vale do Rio Doce.


Rio do Carmo - um Rio ferido de morte pela Cia Vale do Rio Doce
Meu pai, Seu Militino Vitorino Cruzué, nasceu em um sítio no Córrego do Bubu, e foi registrado em Barra Longa. O o velho Sebastião Vitorino Cruzué, meu avô, era de São Pedro dos Ferros. Eu também nasci no tal Córrego do Bubu, um pequeno afluente do Ribeirão do Carmo, mas fui registrado em Cartório de Ponte Nova.

Quando voltei em 1965, para rever meu berço natal, eu fiz uma breve viagem acompanhando a Dona Glória, minha mãe. Nós saímos de Iapu,  de ônibus, para Caratinga. Em Caratinga nós compramos passagem na Empresa Pássaro Verde, em direção a cidade de  Ponte Nova. Chegando em Ponte Nova, eu conheci, pela primeira vez a "Maria Fumaça". Quando aquele monstrengo de aço veio atrás de mim, soltando um vulcão de fumaça pela chaminé, rugindo como um trovão, eu tremi nas minhas calças curtas. Se minha mãe não segurasse minha mão, eu estaria correndo até hoje.

Fomos de Maria Fumaça, da Companhia Leopoldina Railway, itinerário de Ponte Nova - Dom Silvério. Pelo caminho, passamos por Pontal e descemos em uma pequena vila chamada Chopotó ou Xopotó. O trem soltava uma nuvem enorme de fumaça e pequenos grãos de carvão ou de algo parecido de sua chaminé. aquelas bolinhas caiam nos olhos dos passageiros, e eles ficavam vermelhos. De Ponte Nova à Dom Silvério, boa parte do caminho seguia à margem do Rio Piranga, e depois de Chopotó, onde eu desci, ele se junta com o Ribeirão do Carmo para formar o Rio Doce.

Assim que descemos, caminhamos uns 05 quilômetros até a casa do Tio Zé Brás. Minha mãe tinha muita afinidade com Tia Maria. À noite fui com as duas para tomarmos banho na cachoeira do Rio Carmo, onde as águas borbulhantes à luz da lua, era como prata pura. Hoje, passou a ser pura lama da Vale do Rio Doce e Samarco.

Das coisas desta viagem, lembro de ter ido à missa em Chopotó com minhas tias Laudelina e Mariquita, irmãs de meu pai. Mesmo tenho passado 51 anos, também me lembro do sermão do padre, falando sobre detalhes de anatomia das crianças. Ele disse mais ou menos que, quando precisassem corrigir os pirralhos chinelassem só no bumbum, parte do corpo que, segundo ele, Deus tinha feito especialmente para amortecer umas chineladas. 

Também me lembro dos bichanos e dos cachorros das tias, assim como do cardume de barrigudinhos que havia no poço de um córrego, onde caía uma bica d'água para lavar vasilhas.  Lembro-me da fazenda Apaga Fogo, de um vizinho de meu pai, Sr. João da Silva Lana. Para terminar, vi e visitei a casa onde nasci. Curiosamente, há pouco tempo recebi uma foto, presente de meus primos paternos. Ela ainda está de pé. Veja!

Eu ouvia dizer que depois de terminadas as atividades das colheitas, o povo pegava as bateias e iam batear ouro no leito do Ribeirão do Carmo, que desce de Ouro Preto. Dizia os antigos que conheci que este curso d'água também tinha o nome de "Corgo do Ouro".


Bateando ouro no Ribeirão do Carmo
O que restou disso hoje é uma sepultura de lama. Você pensa que com o rompimento da barragem, a lama acabou? Não! Ela continuou correndo por dias e meses. De Barra longa para baixo, o Ribeirão do Carmo morreu e foi sepultado. Da sua junção com o Rio Piranga, nasce o Rio Doce. Deste trecho até o mar capixaba, é pura lama e é lama pura.

Não bastasse a expropriação do ouro do século XVIII, agora as montanhas de ferro das Gerais exportadas à preço de banana. Neste processo, o lixo remanescente é estocado em lagoas de lama, com barragens de contenção feitas com material de terceira. Um gatilho de armadilha que foi acionado e o estrago foi muito grande. Acabou-se o Ribeirão de cachoeiras prateadas e o Rio Doce só voltará a ser doce, de fato, daqui a uns 50 anos - e olhe lá.

Eu bem sei que aquelas multas bilionárias, são apenas conversa fiada para enganar o ouvido de tolos.



sábado, novembro 07, 2015

Geografia do caminho da lama da barragem da Samarco em Mariana


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Um rio de lama passou por cima de Bento Rodrigues

Distrito de  Bento Rodrigues - Mariana-MG
POR: JOÃO CRUZUÉ
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Nasci em um sítio no  Córrego do Bubu,  no antigo distrito de Xopotó. Ali passa Rio do Carmo que fazia divisa do sítio do meu avô Sebastião Vitorino Cruzué com outros sitiantes. Naquela época (1956) meu pai era recém-casado e também morava por ali. Minha mãe e eu chegamos a tomar banho nas águas encachoeiradas deste Ribeirão do Carmo que descia de Barra Longa, Ouro Preto e Mariana/MG. Eu soube que, nos anos 50, no tempo de descanso (secas) das atividades agrícolas, o povo do campo ia batear ouro nas areias do Ribeirão do Carmo - antes chamado de "Corgo" do Ouro. 

Nesta primeira semana de novembro de 2015, um desastre ocorreu em duas barragem de mineração, para cima de Mariana, chamou a minha atenção (e a do mundo inteiro), tal fora a violência  com que um rio de lama vermelha desceu, arrasando tudo pelo caminho, a partir do povoado chamado Bento Rodrigues. 

Curioso, fui estudar a Geografia do negócio, pois tenho ouvido muita tolice sobre o caminho da lama, previsto para chegar em Governador Valadares depois de domingo.

De uma forma bem simples, e com apoio dos mapas do Google maps, a coisa é assim: Uma barragem da Samarco Mineradora estourou (Fundão) e levou consigo também a lama da barragem de Santarém que fica a jusante, 15 km acima do distrito de Bento Rodrigues. O curso d'água nesta região é o Rio Gualaxo do Norte. Este Rio desce  (de Oeste para Leste) até a cidade de Barra Longa e se torna afluente do Rio do Carmo ou Ribeirão do Carmo como se dizia antigamente. 

O Rio do Carmo segue em direção à cidade de Rio Doce, passando pelo sítio do meu avô paterno (já falecido), para se juntar com o Rio Piranga, que vem da cidade de Ponte Nova-MG. Na junção das águas destes dois Rios forma-se o Rio Doce. 

Daí para frente, vem outras cidades, com destaque para Ipatinga, Governador Valadares, Conselheiro Pena, Resplendor e Aimorés no Estado de Minas. Depois, no Estado do Espírito Santo vem Baixo Guandu, Colatina e Linhares.

Em nenhum momento o Rio Piracicaba entra no curso desta desta lama. Apesar de passar muito perto, ele saí de outra vertente, 30 km ao norte da lavra de mineração da Samarco. Em lugar de descer para o Rio do Carmo, o Rio Piracicaba segue em direção a João Monlevade, passando por Nova Era, descendo para Tímoteo, Cel. Fabriciano, até se juntar ao Rio Doce na cidade de Ipatinga. 

A lama também nunca iria atingir a cidade de Ponte Nova, pois não poderia subir pelo Rio Piranga acima, a partir da sua junção com o Rio do Carmo lá embaixo.

Clique nas fotos abaixo para que elas se abram totalmente para você analisar melhor o caminho da lama que começou com o desmoronamento de uma barragem, que por sua vez estourou outras duas no município de Mariana-MG

Matéria atualizada em 11.11.11: Notícia importante. Hoje veio ao conhecimento  da sociedade brasileira que as licenças ambientais da Mineradora Samarco (Vale do Rio Doce)  estavam vencidas. Sendo isto verdade, não havia fiscalização alguma por aquelas bandas...



Fonte das Fotos: Google Earth;
Edição do Mapa: João Cruzué;
Fonte da localização das Barragens: Corpo de Bombeiros/MG

Foto 1 - Barragens da Samarco

As Barragens do Fundão e Santarém desmoronaram. A Barragem Germano ainda está de pé.


 Foto 2: Como aconteceu
                                       
A Barragem Fundão desmoronou, a lama desceu e extravasou a Barragem Santarém que estava no caminho.  No caminho da lama estava Bento Rodrigues, um Distrito da cidade de Mariana-MG. Depois de Bento Rodrigues, a lama chegou ao Rio Gualaxo do Norte. O Rio Gualaxo do Norte é afluente do Rio do Carmo, o encontro das águas fica antes da Cidade de Barra Longa. O Rio do Carmo, ou Ribeirão do Carmo, segue até as proximidades da Cidade de  Rio Doce onde suas águas se unem com as do Rio Piranga, que vem da cidade de Ponte Nova; juntos, os dois rios formam o Rio Doce que sobe até a cidade de Ipatinga onde recebe um grande afluente, o Rio Piracicaba, que vem das vertentes de Itabira/João Monlevade. Depois o Rio Doce continua indo para o Norte até Governador Valadares, onde muda de direção para o Leste, seguindo para o Estado do Espírito Santo onde desemboca no mar. Segundo notícias veiculadas na imprensa, a lama tirou todo oxigênio da água e, por onde passou, matou todos os peixes do rio.


Foto 3: o Rio Gualaxo do Norte desagua no Rio do Carmo na cidade de Barra Longa-MG


Foto 4:  o Rio Carmo se junta com o Rio Piranga  para formar o Rio Doce, no município de 
Rio Doce, antigamente conhecido como Alto do Rio Doce.



Mapa 1: Junção do Rio Piracicaba com o Rio Doce na cidade de Ipatinga-MG
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Rio Piracicaba x Rio Doce




Foto 5: A casa onde nasci, perto do Rio do Carmo

Ela fica a 500 metros do Ribeirão do Carmo
Córrego do Bubu
a 5 km da antiga estão de trem de Xopotó.



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